Universo Paralello Festival: um conceito de humanidade, respeito e tolerância
O Universo Paralello proporciona aos fãs da música eletrônica uma realidade distinta ao que estamos acostumados, cada pessoa que frequenta o festival tem uma experiência completamente diferente que, no entanto, se consolida como algo único e maior que todos ao prevalecer o respeito e tolerância entre as pessoas que vivenciam os 7 dias de festa.
O próprio nome, Universo Paralello, sugere a essência e o significado do que é o festival. Você é inserido em um mundo distinto à realidade que está acostumado a viver. Lá você esquece tudo que está no campo das ideias, da mente humana, é como se você literalmente quebrasse os pensamentos que rotulam e julgam, desse jeito eles não serão capazes de te incomodar e isso, naturalmente, leva a transformar-se tudo em prática.
É como se você se despisse diante de milhares de pessoas e o julgamento alheio e o auto julgamento não tivessem importância, pois você eliminou os pensamentos da mente, sejam negativos ou positivos. “Você simplesmente quer, então faz, afinal, você está no UP!!!” Essa foi a frase mais comum no festival.
No Universo Paralello o lugar onde as pessoas tomavam banho é unissex e a água vem do mangue, uma galera que se sentiu mais a vontade tomava banho completamente nu. Essas coisas são vistas com naturalidade dentro do UP. Como disse um rapaz de Brasília em seu relato no Facebook “(…) talvez tenhamos dado o nome errado. Talvez o mundo paralello (festival) seja o real. E esse mundo onde a gente fica esperando o próximo universo seja o mundo irreal”. Ele diz isso pela controvérsia que a gente percebe durante o festival em comparação a realidade que vivemos diariamente em nossas vidas, uma realidade em que as pessoas julgam cada vez mais os outros pelas diferenças. A tolerância e respeito, filosofia do Universo, é vista com frequência lá em Pratigi, ao contrário do que acontece no dia-a-dia de muitos brasileiros.
Andar pelo festival nu, seja pela praia ou até mesmo no 303 Stage, é algo além da conotação sexual. Ficar peladão no UP é muito mais do que deixar as partes íntimas à mostra. Esse ato significa que a pessoa despiu-se de todo julgamento que pode existir e simplesmente ligou o fod*-s* apenas para SER o que quis naquele momento sem pensar no que era antes e no que vem depois, é uma questão de estar presente no tempo e aproveitando o momento!
O clima é tão amistoso que pôde ser notado até mesmo de fora do festival. Na Vila dos Pescadores de Pratigi, em determinado momento, em um restaurante um grupo de amigos estava conversando entre si e fumando um baseado e, ao invés de serem repreendidos pelo garçom do local, o que se ouviu foi: “É família UP, né?” Aliás, Pratigi por mais pequeno que possa ser confortou bem todos os visitantes que ficaram espalhados pelas dezenas de pousadas da região. O movimento que o festival faz por ali é tão intenso que pessoas de cidades vizinhas se deslocam para lá a trabalho pois a demanda é muito alta. As pessoas que preferiram se hospedar fora do UP contavam com internet wifi, e alguns restaurantes (até mesmo improvisados em pequenos mercados), mas tinham que percorrer um longo caminho até o festival, embora contassem com o pau de arara ou buggys.
A infraestrutura interna do Universo Paralello atendeu as expectativas de boa parte do público. Banheiros sempre limpos e a praça de alimentação com diversos produtos alimentícios: pizza, lanches, prato feito e bastante opção para veganos. As filas nos banheiros e bares próximo aos palcos ficou grande em situações momentâneas quando um grande dj/produtor tocava.
Como o local é – mesmo – paradisíaco . O nascer do sol, lá, é diferente, ao invés de vir aquela luz dura que estamos acostumados em outras regiões, na Bahia ao amanhecer a luz do sol é difusa e isso provoca uma sensação de estar sendo abraçado ao invés de receber fortes luzes diretamente na retina. A necessidade das pessoas dividirem o espaço com a natureza também existiu, para facilitar isso, a organização do evento criou acessos entre uns caminhos para outros. Do MainFloor até a praia, passarelas de madeira foram construídas sob um mato, por exemplo. Enquanto que nas laterais das passarelas o mato alcançava quase dois metros de altura, a parte que ficava sob as madeiras teve cerca de 1m40cm cortada. A curiosidade fica por conta dos ninhos de pequenas cobras que foram vistos por quem passava por ali. Uma situação cômica para não considerar assustadora. (risos)
A galera ficou surpresa com a decoração simples do MainFloor e isso gerou comparações com o palco principal da edição passada. O sentimento era de decepção ao não encontrar nenhum desenho, projeção, ou algo assim para o carro chefe do festival, além disso o som falhou algumas vezes. Mesmo sem projeções a iluminação não deixou a desejar, essa sim superou as expectativas. No cair da noite, o MainFloor era iluminado por canhões de luzes que refletiam nas cores florescentes da tenda.
O palco mais bonito dessa edição foi o 303 Stage. O primeiro a tocar ali foi o mestre Goa Gil, por mais de 25 horas o vovozinho psicodélico deu uma aula de disposição. O set começou no inicio da primeira noite, quando toda a tenda já estava iluminada e funcionando em perfeito detalhes. O pilar central da estrutura deu suporte em suas laterais para uma decoração que se locomovia para cima, para baixo e simultaneamente girava em 360º . Da pra ter uma ideia do quanto isso fez a imaginação de muitos que ficaram por ali ao longo dos 7 dias. Act One – LIVE!, Vermont – LIVE!, Groundbass – LIVE!, Fabio Fusco – LIVE!, MAD MAX – LIVE!, entre outros projetos muito fodas passaram por este palco.
Outra grande mudança perceptível nos palcos foi no investimento enxuto para o UP Club. O espaço era maior em relação às edições anteriores como afirmado por alguns fãs. A iluminação durante a noite estava impecável e era possível ver as luzes refletindo nas nuvens mesmo de fora do festival. Assim como no 303 Stage, o UP Club era perto da praia, por isso, você podia curtir o som da areia, na maior tranquilidade, assim como muitos fizeram. Por ali a apresentação memorável ficou por conta do alemão Boris Brejcha. O bruxo do minimal techno subiu à cabine para tocar às 2h30 da primeira madrugada do ano, tocou mais do que o previsto e ainda mandou um som que compartilhou muito bem para a viagem do público até o mundo espacial. (risos)
O palco por si só não tinha nada de mais na estrutura, no entanto, em sua volta diversas bandeiras serviram para dar uma imagem bonita e colorida, assim como dar sonoridade ao vento que as faziam tremular na beira da praia, do lado direito uma feira hippie com diversos produtos artesanais bem bacana completava a decoração. Este espaço era definitivamente um bom local para se sentir ainda mais tranquilo e em paz.
O palco ideal para surpresas e novas experiências tinha um outro nome: Tortuga Stage. O palco foi inspirado na Ilha da Tortuga, localizada no mar do caribe, onde piratas faziam escambo. A decoração, visto de uma visão aérea, lembrava um polvo. Quem passou por lá viveu momentos incríveis no que foi considerado o palco mais democrático do UP 14, ele foi o primeiro a abrir no festival, dia 27 às 11h, e contou com apresentações de artistas de vários gêneros musicais. Em determinados momentos por conta da sua imensa variedades de estilos pode ter ocorrido concorrência direta com o palco chill out que teve algumas vertentes musicais parecidas com o que era apresentado no Tortuga.
Em suma, parece que a produção do evento procurou equilibrar o investimento nos palcos em relação às edições anteriores, quando o MainFloor concentrava as atenções da organização.
O público elogiu o espaço concedido aos artistas menos renomados, mas houve crítica porque estava complicado para identificar qual a vertente dos músicos desconhecidos. Isso poderia ter sido feito no folder do lineup que é entregue na entrada para todos, bastasse colocar a vertente a frente do nome do artista. “Um projeto bom não foi visto por mais pessoas porque não tinha identificação sobre o seu estilo, e ai muita gente preferia ficar onde já tava” diz uma fã de Fortaleza. As grandes apresentações foram notadas com palcos completamente lotados, assim como foi com Goa Gil e Fabio Fusco no 303 Stage, Astrix, Vegas, Vini Vici e Pspiralife no MainFloor e o Boris Brejcha e Alok no UP Club.
No Circulou, espaço reservado para intervenções, cura, massagem e meditação, a movimentação também foi boa. As pessoas eram orientadas por professores, recebiam diversas dicas com foco no descanso, relaxamento e recuperação física/mental. Esse espaço era a prova do equilíbrio do festival, o UP é um evento para a família e todos podem aproveitar as coisa que proporciona.
Um ponto muito bacana no Universo Paralello é a liberdade em montar sua barraca em qualquer lugar do festival, somente alguns lugares restritos a produção do evento não são permitidos para camping. Essa situação é favorável para quem curte montar a barraca próximo aos palcos e teve muita gente que fez isso ao lado do MainFloor, UP Club, principalmente do Chill Out, Palco Paralello e Circulou. O problema foi para quem chegou no primeiro dia do evento, como em meu caso, montar sua barraca e sair para o role, e quando voltava sempre tinha uma, duas, três ou até mais barracas montadas em volta da sua. Isso te faz perder um pouco a noção de localidade quando não se tem um ponto de referência, porque as pessoas chegam e vão embora a todo momento, o ambiente em que você monta sua barraca muda constantemente com isso. É uma loucura! (risos)
Sobre o autor
Renan Fernandes
28 anos, fotógrafo e jornalista que fala sobre política, sociologia, filosofia e música.