A arte imita a vida? Joyce Muniz fala sobre lançamento de seu segundo álbum, Zeitkapsel
Por Mia Lunis
A carreira de Joyce Muniz traz entusiasmo para a cena eletrônica. A brasileira, que atualmente mora em Berlim, traz em seu currículo uma vastidão de sucessos e parcerias importantes, tanto na vida, quanto na música. Joyce é cantora, DJ, produtora e MC, e já lançou em gravadoras renomadas, como Get Physical, Permanent Vacation, Pets e Exploited – nesta lançou seu primeiro álbum, em 2016, intitulado “Made In Vienna”, em menção à capital austríaca, onde morou.
O portfólio musical de Joyce Muniz vai muito além. A bola da vez é o vislumbre que os ouvintes obtiveram do seu segundo álbum “Zeitkapsel”, através do lançamento do single “Arrivederci Bella”. A faixa traz uma perspectiva evoluída sobre a experiência de término de relacionamento, afinal, quem nunca sentiu vontade de se jogar na noite para mandar a tristeza embora?
O "tchau, linde" de Joyce Muniz vem sem sentimentos de pesar. É mais um "até logo", deixando o terreno livre para que as emoções se transformem e abram espaço para a criatividade que a vida de artista pede. Nesta faixa, a cantora solta a voz e transpõe uma vibe contagiante.
O álbum "Zeitkapsel" é como um resumo de vivências expressas através da música eletrônica; conta uma boa parte da trajetória pessoal da produtora, em faixas como “These Days”, que fala de seu tempo na Áustria, e "Bangalore Girl", um Drum n' Bass aprovado pelo DJ Marky que traz memórias de sua turnê na Índia, quando se descobriu como MC.
Chegando no presente momento, ‘Tempelhof’ é uma ode a Berlim, agitada capital dançante que virou o oásis criativo de Joyce durante a pandemia, além de ter sido o local onde a artista finalizou o álbum. Para entendermos um pouco mais, tivemos o prazer de conversar um pouco com Joyce. Confira:
Play BPM - Joyce, é um prazer recebê-la para essa entrevista. Além de "Arriverdeci Bella", você lançou também o single “In Der Nacht” em parceria com Karl Michael. Como foi esse encontro e como se deu o processo de produção da faixa entre vocês?
Depois que o álbum foi feito, percebi que o álbum tinha um título em alemão, mas nenhuma faixa com vocais em alemão. Eu basicamente fiz a batida em um dia. Meu amigo Karl Michael (que na verdade é designer de moda, DJ e ativista queer) fez os vocais e as letras durante uma sessão privada. A letra é sobre o estado surreal e hipnagógico que conecta sonhos e realidade a coisas que podem acontecer durante a noite ;). Estou muito feliz com este single, principalmente porque tenho uma ligação muito forte com a Áustria e a Alemanha. Fazer uma faixa com vocais em alemão foi algo que nunca tinha feito antes e sempre quis fazer. Além disso, o vídeo é incrível. O diretor de vídeo Noah Rosa fez um ótimo trabalho e Karl Michael fez uma ótima atuação.
Play BPM - Nos conte mais sobre o processo de composição do álbum Zeitkapsel. Quanto tempo levou e quais foram os elementos sonoros que você mais curtiu adicionar na produção?
A ideia de produzir um segundo álbum já existia há muito tempo na minha cabeça. Eu sempre quis fazer um álbum pelo qual eu poderia apresentar todos os gêneros musicais no mundo eletrônico que influenciaram a minha carreira como DJ e produtora. Durante a época da Covid, eu finalmente consegui o tempo que me faltava para pesquisar e focar nesse projeto.
Eu não queria fazer só música para o clube. O álbum tem 12 faixas que vão de 90 BPM até 170; tem estilos como Trip Hop, Drum N' Bass, Hip-Hop e Break Beat, que me influenciaram muito no final dos anos 90. Além disso, Indie Dance, Electro e Deep House, que estão mais presentes na minha carreira hoje.
O álbum tem vários elementos sonoros, sons indianos, electro e percussões eletrônicas. Para acrescentar às produções, eu convidei vários vocalistas, como Roland Clark, Fritz Helder (Azari III), Leciel, Play Paul e Karl Michael. Até eu acabei fazendo vocal em português, faz muitos anos que eu não fazia isso. Mas como esse álbum conta um pouquinho do meu histórico musical, achei que tinha tudo a ver. A mistura de Samba e Electro era uma coisa que eu nunca tinha feito antes.
Play BPM - Sendo uma artista multifacetada, qual das funções você gosta mais e onde você se encontra pessoalmente em cada uma?
Eu gosto de todas, porque cada uma tem sua qualidade e uma diversão. Pra mim é muito sobre amar o que eu faço. Mas é uma profissão que eu gosto é radialista, que sou há 15 anos. Sou residente de umas das rádios mais importantes para a música eletrônica e alternativa, Radio FM4, e eu também tive uma residência durante 5 anos na Rinse FM, de Londres.
Eu acho rádio tudo! Posso tocar diferentes gêneros musicais, convidar artistas… lógico que eu amo tocar para o público, discotecar e foi a minha primeira profissão em que eu me conectei com a música eletrônica, sendo assim, vai ser sempre uma das minhas prediletas. Apesar de que hoje entendo toda essa experiência que eu juntei nas 2 últimas décadas; eu adoro sentar no estúdio e testar novas ideias com meus synthesizers e umas das coisas que eu realmente gosto de fazer na parte de produção e fazer remix para outros artistas. Sobre cantar, eu nunca me vi como uma verdadeira cantora, eu sempre fiz vocal na base do improviso.
Play BPM - Qual é a história em torno do seu contato com a cena brasileira, mesmo estando na Europa e como você vê a cena brasileira de hoje?
Primeiro, eu comecei minha carreira na Europa aos 16 anos. Quando eu saí do Brasil com os meus pais, eu era criança e não tinha nem ideia sobre essa cena. Minha conexão com a cena brasileira começou quando eu me tornei DJ residente aos 17 anos no clube Flex Vienna, no início dos anos 2000. Na época, o clube começou a convidar artistas brasileiros, como DJ Marky, DJ Patife, DJ Andy, Gui Boratto, Ramilson e por aí vai.
Eu, sendo brasileira e residente do clube, era colocada para abrir ou fechar para os artistas brasileiros. Foi assim que eu fiz vários amigos e me conectei com a cena. Na época eram alguns nomes brasileiros que lançavam em selos internacionais. Hoje tem muito mais artistas brasileiros lançando música e fazendo turnê pelo mundo. O Brasil tem um mercado grande, que se tornou importante para eventos. Em termos de selos, acho que tem muito o que melhorar. Pelo o que eu percebo, tem muita gente nova fazendo música.
Play BPM - Você tem alguma dica para os artistas que estão começando a produzir?
Não desanime se uma track ou uma ideia não sair como você espera. Quando uma música não vai pra frente, pare e comece uma nova. Quando os elementos não fluem, é um sinal. A melhor maneira de achar seu próprio estilo é fazendo esboços. Como o velho ditado diz: "a pressa é a inimiga da perfeição". Eu demorei muitos anos para achar o próprio estilo, e mesmo assim nunca parei de aprender, pesquisar e achar novas fontes de influência, pois, pra mim sempre foi importante fazer o novo, não copiar o que existe; o que já existe não é novidade.
Play BPM - Joyce, muito obrigada por nos conceder essa entrevista! Qual o aspecto fundamental para uma carreira musical?
Às vezes você tem que correr o risco. Quando decidi lançar uma gravadora só para lançar meu novo álbum ‘’Zeitkapsel’’, fiquei com um pouco de medo. Mesmo que eu tivesse todos os tipos de possibilidades de selos, pensei que era hora de assumir os riscos e fazer isso por conta própria. É um novo desafio, mas é bom poder fazer coisas que sempre quis fazer e não precisar pedir permissão a ninguém para lançar um álbum. Às vezes é preciso arriscar para realizar os seus sonhos.
Imagem de capa: divulgação.