Relatório sobre racismo aponta falta de transparência na indústria da música
O relatório do Black Music Action Coalition (BMAC) afirma que as ações da indústria do entretenimento, inclusive da música eletrônica, são insuficientes para romper com as injustiças sociais que causam impacto na vida dos negros. As promessas públicas elaboradas após o assassinato de George Floyd serviram de base pro relatório que tem como objetivo ampliar a discussão sobre o espaço do negro na indústria da música.
Em um dos trechos do documento, a análise foi feita dividida em quatro áreas com notas que variam do A ao F: declaração e compromisso, representação dentro da empresa em nível executivo e sênior, execução dos compromissos e promessas e ações efetivas para provocar mudanças estruturais e sistêmicas.
A gravadora Sony, conhecida mundialmente, tirou nota B em três critérios e C em um, com isso, o relatório concluiu que a empresa “tem compromisso, ações efetivas e negros em posição de poder, mas deixa a desejar na conexão com a cultura e a comunidade negra”. Enquanto isso, a Warner que tem artistas como Cardi B, Lizz e Bruno Mars em seu casting, “não apresenta um esforço mínimo pra que negros estejam em posição de poder dentro da empresa e não demonstrou medidas pra provocar mudanças estruturais e sistêmicas” no corpo técnico, sênior, conselho e desenvolvimento.
Uma outra forma de classificação foi adotada para entender o esforço por mudanças reais dedicado pelos serviços de streaming. Com uma escala de "insatisfatório", "precisa melhorar", "satisfatório" e "excelente", as empresas foram analisadas a partir de três perguntas: fez alguma promessa? Refletiu a conexão da empresa com a cultura negra? Os trabalhos são contínuos?
A partir disso, o documento conclui que a Amazon Music, Spotify e YouTube Music tiveram desempenho “satisfatório”, enquanto a Apple Music “precisa melhorar”. O cenário fica pior com a análise das empresas que produzem música ao vivo. Entre as sete analisadas, duas tem situação insatisfatória, quatro precisam melhorar e uma tem cenário satisfatório.
Os apontamentos foram realizados a partir da análise feita entre 2020 e junho de 2021, pelo corpo técnico de mais de 200 artistas, empresários, advogados e aliados negros. Eles explicam que “a história sugere que qualquer mudança foi superficial ou de curta duração”, com pequenos progressos e constantes regressos. Além disso, o espaço de origem cultural preta e periférica tem sido tomado pelos brancos que buscam lucro e, consequentemente, acabam por excluir os negros.
Em 1972, por exemplo, a Columbia Music Group pediu um estudo pra Harvard Business School pra entrar no mercado da música produzida por negros. Alguns anos depois, os negros que participavam da cena muito antes dos brancos, por meio dos trabalhos desenvolvidos com programação de rádio, executivos e artistas, foram eliminados da participação efetiva e da tomada de decisões sobre o mercado da música produzida por negros.
Quase meio século depois o cenário continua vergonhoso entre as 70 empresas musicais independentes, com 4,2% dos principais executivos negros.
O relatório ainda destaca que recentemente toda comunidade musical se reuniu em torno das publicações nas redes sociais de uma imagem preta com as hashtags em apoio aos companheiros negros e negras que sofrem com as injustiças sociais. A ação serviu para que a indústria concedesse espaço, voz, visibilidade e participação dos negros em áreas executivas, artística, fornecimento e outros setores relacionados. No entanto, o documento reforça que a maior barreira pra concretização das ações são as práticas de longa data que prejudicam a transparência e responsabilidade social. Na preparação do relatório, por exemplo, a maior parte dos selecionados pra entrevistas e debates negaram participação.
Portanto, a reflexão proposta a partir das postagens em redes sociais foi apenas um momento de pausa e reflexão sobre quais ações podemos tomar pra apoiar a comunidade negra, mas de lá pra cá não houve mudanças efetivas e muito menos significativas. Por outro lado, mesmo que com a maior parte das empresas entrevistadas tendo negado o convite pra falar sobre o assunto, de modo geral a indústria deu pequenos sinais sobre a presença do racismo sistêmico e a desigualdade social na história da música até hoje. Isso é fundamental para que a indústria faça planos objetivos pra mitigar os efeitos do racismo na cena.
Em suma, as empresas de música estão atrasadas no debate. A questão agora, conforme o relatório, é fazer com que as empresas discutam o assunto abertamente e façam os investimentos necessários em busca de mudanças efetivas e sustentáveis.
Sobre o autor
Renan Fernandes
28 anos, fotógrafo e jornalista que fala sobre política, sociologia, filosofia e música.